Representantes do setor da saúde e de previdência complementar apontam que iniciativa privada e sem fins lucrativos desafogam gastos do poder público na saúde para justificar aumento ou manutenção de tratamento favorecido na reforma tributária. Os pedidos foram feitos em audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) realizada nesta terça-feira (12).
A reunião, presidida pela senadora Augusta Brito (PT-CE), foi a quarta de 11 previstas na CCJ para analisar o projeto de lei complementar (PLP) 68/2024 , regula a transformação de cinco tributos (ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins) em dois: um imposto sobre o valor agregado (IVA) sobre o consumo, dividido entre os níveis federal e estadual/municipal; e o Imposto Seletivo. O texto é relatado pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM).
Segundo o senador Efraim Filho (União-PB), o poder público precisa refletir a vontade dos cidadãos e dar tratamento favorecido à área da saúde, em contraponto com a necessidade de os governos arrecadarem recursos.
— Há temáticas que precisam ter um olhar diferenciado, e a saúde tem sido um deles. Os governos [federais, estaduais e municipais] têm que se adaptar à alíquota que o cidadão brasileiro consegue arcar. Tenho convicção de que o Senado não quer e não irá entregar o maior IVA do mundo como se tem dito por aí.
Serviços cirúrgicos, consultas médicas, vacinação e outros 24 serviços de saúde terão redução de 60% da alíquota-padrão do novo IVA, estimada em cerca de 28%, a ser aplicada como regra geral a todos bens e serviços consumidos no país. Atualmente, o consumo é tributado por regras esparsas e elaboradas por cada um dos 27 estados e dos 5.570 municípios.
Todos os medicamentos deveriam ser livres do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) — que representam a parte estadual/municipal e federal do novo IVA —, na opinião do presidente-executivo do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), Nelson Mussolini. Segundo ele, aumentar as vantagens poderá desafogar o SUS com relação ao fornecimento de medicamentos.
— Quando o médico prescreve um produto, se a pessoa não consegue comprar na farmácia, ela se socorre no posto de saúde para buscar esse medicamento. Dessa forma, ele pressiona o Sistema Único de Saúde — disse.
O presidente-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos e Biossimilares (Pró-Genéricos), Tiago de Moraes Vicente, defendeu a manutenção da atual versão do PLP 68/2024, aprovada na Câmara dos Deputados. O texto dá a 383 medicamentos alíquota zero de IBS e CBS; os demais remédios terão 60% de redução dos tributos.
O texto prevê ainda que os planos de saúde também terão redução de 60% da alíquota, segundo o representante da confederação de empresas de saúde suplementar (CNSeg), Bruno Toledo Checchia. Ele elogiou o tributo reduzido, mas criticou o que ele considera uma desigualdade nas negociações feitas por sindicatos de trabalhadores, com relação à possibilidade de recuperar, na forma de crédito, o tributo pago.
— Quando uma empresa por força de convenção coletiva (negociação feita com o sindicato do empregador) contrata plano de saúde, pode se creditar; e a outra empresa que é obrigada por força de um acordo coletivo (negociação feita diretamente com a empresa) a contratar esse mesmo plano, não teria direito ao crédito — afirmou.
O creditamento é uma forma de assegurar que o tributo sobre o consumo seja arcado só pelo consumidor final. Como regra da reforma tributária, as empresas que atuam no meio da cadeia de produção ou de serviço e pagam IBS e CBS nas suas aquisições podem ter o valor de volta na forma de crédito, para abater posteriormente nos tributos devidos ao governo. As empresas que fornecem produtos ou serviços que não dão direito a crédito, portanto, temem ser menos atrativas ao mercado.
A demanda também foi feita pelo representante da Confederação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos (CMB), Renato Guilherme Machado Nunes. As entidades filantrópicas são imunes (não podem ser cobradas pelos novos tributos) e não podem utilizar créditos das aquisições que fizerem.
O presidente da Associação Nacional de Apoio às Pessoas com Deficiência (AnaPcD), Abrão Dib, pediu que o novo IVA zerado para compras de veículos por PcD seja possível para veículos de até R$ 200 mil. O texto prevê o valor máximo de R$ 150 mil por veículo, sendo que no máximo R$ 70 mil da compra pode receber a isenção do imposto.
Para Abrão Dib, a redução não se trata de um “benefício”, mas de uma contrapartida do Estado por não fornecer transporte público apropriado para as necessidades das PcD.
— A pessoa hoje deixa de comprar uma cadeira de rodas sob medida adequada para ela para ter um carro na garagem, porque ela precisa do carro para trabalhar, para fazer o tratamento médico…
Representante da Associação Brasileira de Academias (Acad Brasil), Emerson Casali Almeida afirmou que os requisitos exigidos para as academias desfrutarem da redução de 30% da CBS e IBS inviabilizarão o tratamento favorecido para a maioria dos estabelecimentos. O projeto só permite a redução se, cumlativamente, a academia:
Segundo Almeida, o resultado será um mercado com desigualdade na cobrança de impostos dos estabelecimentos, em que poucos terão redução de 30% na alíquota; outros pagarão o imposto cheio; e a maioria serão pequenos negócios com regime tributário simplificado (Simples Nacional).
— Não tem como competir. O que acontece com a empresa do Simples? Ela não pode crescer [em razão do limite anual de faturamento]. Aí o sujeito abre uma outra empresa, uma no nome da mãe, a outra no nome da irmã, e por aí vai…
Os fundos de pensão (que gerenciam investimento para aposentadoria complementar) e planos de assistência à saúde sob a modalidade de autogestão (quando o próprio órgão público ou empresa gerencia seu plano de saúde) não serão contribuintes do IVA. A previsão do PLP 68/2024 na forma aprovada pelos deputados foi defendida pelos representantes da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), da União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde (Unidas) e da Associação Nacional dos Funcionários do Banco do Brasil (Anabb).
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